De 09 a 16 de maio acontece a 7ª Semana André Carneiro. Esse ano o evento ficará marcado pela polêmica e pelo inusitado. Tempos de turbulências causados por uma pandemia sem previsão de como, e quando terminar. Tempos de cidades vazias, como antecipou André Carneiro no conto “A Espingarda”, de 1966. O ano começou polêmico, quando fomos surpreendidos por um edital lançado pela Secretaria de Cultura tentando alterar a forma de organização da Semana André Carneiro. Detalhe: o edital foi lançado sem consultar seus realizadores, ignorando todo histórico de realizações ocorridas nas seis edições anteriores, de forma autoritária e sem conhecimento de causa. Saiba mais aqui. A finalização desse imbróglio foi à apresentação de somente um projeto no edital de chamamento. Projeto recusado pela equipe de avaliação por descumprir suas exigências. Enfim, tanta coisa pra nada! A polêmica também fez parte de outro evento ocorrido há setenta anos que fará parte da programação desta 7ª edição: a “Primeira Exposição Coletiva de Pintura de Atibaia”. Evento sem precedentes no país, quando uma pequena cidade do interior abrigou parte importante da história da Arte Moderna Brasileira. Aqui foram expostos originais de Guignard, Oswald de Andrade Filho, Franz Weissmann, Cicero Dias, Di Cavalcanti, Flávio de Carvalho, Flexor, Milton Dacosta, Anita Malfatti, Aldemir Martins, Quirino da Silva, Maria Leontina, Sergio Milliet, Walter Levy, Livio Abramo, Odeto Guersoni, Carlos Scliar, Oswaldo Goeldi, Athos Bulcão e outros. Promovido por André Carneiro, sua irmã Dulce e Ruth Diem, a exposição foi inaugurada dia 28 de junho de 1950, contando com a presença e a obra de todos os organizadores: Aldo Bonadei, Geraldo de Barros, Lothar Charoux e João Luiz Chaves, além de pinturas do próprio André e fotografia de sua irmã Dulce. A mostra aconteceu no saguão do recém-inaugurado Cine Itá, marcando o inicio do “Clube de Cinema de Atibaia”, entidade jurídica também criada por André Carneiro e demais participantes do jornal literário “Tentativa”. No Clube de Cinema eram exibidos filmes de arte e debatidos pelos participantes no final de cada sessão.
O próprio histórico da Arte Moderna no Brasil é marcado pela polêmica, desde a primeira Exposição de Pintura Moderna ocorrida por iniciativa de Anita Malfatti, em 1918. Exposição que passou a ser considerado um marco na história da arte moderna no Brasil e “estopim” da Semana de 1922. Não é difícil prever o impacto dessa exposição para os padrões estéticos conservadores da época. O escritor Monteiro Lobato foi seu maior crítico e contra ele arregimentam jovens poetas e escritores como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia e outros, que organizariam mais tarde a Semana de Arte Moderna de 22. A polêmica também fez parte de outro acontecimento que marcou a arte moderna no Brasil, além da própria Semana de 22: O “Salão Revolucionário”, como ficou conhecido a 38ª Exposição Geral de Belas Artes, ocorrido em 1931, no Rio de Janeiro, em razão de ter abrigado, pela primeira vez artistas de perfil moderno e modernista. Participam do Salão artistas de diferentes gerações, mas todos ligados de alguma forma às pesquisas da arte moderna: Tarsila do Amaral, Victor Brecheret, Anita Malfatti, Ismael Nery, Cicero Dias, Portinari, Pedro Luiz Correia de Araújo, Vittorio Gobbis e Guignard. Outro evento marcado pela polêmica aconteceu em 1944, em Belo Horizonte: A "1ª Exposição de Arte Moderna", promovida pelo então prefeito Juscelino Kubitschek no edifício Mariana, que levou para a cidade uma série de obras de artistas modernistas de pelo menos três gerações, provocando “frisson” semelhante ao de 1922 - com direito a protestos raivosos na imprensa e ataques aos quadros dentro da galeria. Essa exposição foi considerada uma espécie de "continuação" da famosa Semana de Arte Moderna de 1922, ocorrida em São Paulo. A "1ª Exposição de Arte Moderna" de Minas Gerais surgiu quando o prefeito Kubitschek decidiu convidar Alberto da Veiga Guignard para realizar um curso de arte na cidade. Guignard sugeriu que uma mostra de artistas modernos fosse promovida como "recepção". Juscelino viu na ideia uma oportunidade de apresentar aos intelectuais paulistas e cariocas o conjunto arquitetônico da Pampulha, criado pelo Niemeyer. Em 1950 André Carneiro e César Mêmolo Junior viajaram a Minas Gerais para entrevistar Guignard e colheram informações sobre o curso de arte que o artista ainda ministrava na cidade. A matéria foi publicada no jornal literário Tentativa número 8, página 5. Veja aqui. Ao considerar as enormes diferenças existentes entre os meios de comunicação da época e consequente tempo de difusão das informações fica evidente a ousadia do André Carneiro, e demais artistas envolvidos, em trazer para Atibaia o que havia de mais atual na época. Em 1944 os modernistas ainda causavam polêmicas e a exposição de Atibaia ocorreu em 1950. A maioria dos artistas presentes na exposição de Atibaia eram os mesmos que participaram das demais exposições citadas acima, apresentando obras originais que, como dizia André Carneiro, atualmente poucas instituições culturais teriam recursos para sequer pagar o seguro das obras. E como não poderia deixar de ser, aqui em Atibaia a exposição também causou polêmica. Os artistas acadêmicos locais, ofendidos com o sucesso da exposição, reagiram criando seu próprio evento: A “Primeira Exposição Conjunta de Pintura, em Atibaia”, que aconteceu no salão do Clube São João FC, meses mais tarde. Despeito a parte, a “Primeira Exposição Coletiva de Pintura de Atibaia” ganhou notoriedade. Segundo a pesquisa de Mauricio Carneiro, a exposição realizada aqui seguiu meses depois para a cidade de São João da Boa Vista- SP acompanhada de uma caravana cultural que saiu de Atibaia liderada por André Carneiro. Na ocasião André realizou a palestra “Para Compreensão da Arte Moderna”, evento que aconteceu no Teatro Municipal de São João da Boa Vista, prédio histórico do município e palco de inúmeros eventos de grande valor artístico para o interior paulista.
Em razão da pandemia, e da impossibilidade de aglomerações, a programação prevista para a 7ª edição da Semana André Carneiro foram alteradas. A ideia inicial era realizar uma exposição com reproduções de obras que integraram a “Primeira Exposição Coletiva de Pintura de Atibaia”, recriando o clima e o valor estético do evento. Infelizmente não mais será possível. Optamos então em transformá-la numa mostra virtual, que terá apoio do Departamento de Comunicação da Câmara de Vereadores de Atibaia e do jornalista Luiz Gonzaga Neto. A palestra preparada pelo psiquiatra e psicoterapeuta Paulo Urban, sobre o amigo André Carneiro, também foi suspenso pelos mesmos motivos. Além da exposição virtual, manteremos o lançamento de uma versão piloto da 6a edição do “Caderno da Semana” e realizaremos uma “live”, com mediação de Juliana Gobbe e convidados. Entre eles Gilberto Sant’Anna, Mauricio Carneiro, Paulo Urban, Carlos Alberto Pessoa Rosa, Márcio Zago e outros. Ela acontecerá dia 09 de maio, sábado, às 20h pela página de facebook da Semana André Carneiro. Dessa forma, embora com uma programação modesta, não interromperemos sua sequencia. A “live” terá também a intenção de cooperar com o Asilo São Vicente de Paula, que esse ano completa noventa anos de existência, abrigando certa de cinquenta anciãos. Maiores informações serão disponibilizadas nas próximas horas. A 7ª Semana André Carneiro tem a realização do Instituto de Arte e Cultura Garatuja. Participe!
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